Três quartos das startups no Brasil buscam modelos de negócio B2B ou B2B2C. Independente dos motivos desta realidade...
Três quartos das startups no Brasil buscam modelos de negócio B2B ou B2B2C. Independente dos motivos desta realidade, passa a ser crítico então encontrar formas de aumentar as chances de sucesso da relação de negócios entre startups e empresas tradicionais.
Nos projetos B2B e B2B2C, um grupo de pessoas a procura de um modelo de negócios repetitivo e escalável, em condições de extrema incerteza (startup), trabalham com um grupo de pessoas executando um modelo de negócio já estabelecido, que atuam dentro de regras definidas para otimizar e perpetuar este modelo (empresa). Estes dois grupos se aproximam e se propõem a resolver juntos uma dor real, com uma solução disruptiva.
Uau!!!! Existe um potencial enorme tanto para isto dar muito certo e também para terminar em um tremendo desgaste.
O acompanhamento de casos de sucesso e fracasso, a experiência de muitos anos em empresas tradicionais, o trabalho de mentoria e aceleração de startups me chamaram a atenção para alguns pontos.
Primeiro: ambos os times têm que ter claro não apenas o que podem ganhar, mas o quanto aceitarão perder nesta busca. A única coisa que realmente é controlável e previsível quando se inicia este tipo de processo é o limite de quanto se quer arriscar: quanto tempo, quanto dinheiro, quantos clientes, etc. Isto deve ser acordado desde o início. O “comprimento da pista de decolagem” precisa ser conhecido por ambos os grupos. Assim, os recursos definidos dentro destes limites podem ser orçados e ter acesso garantido. Este é o famoso conceito de “affordable loss” que qualquer um envolvido com startups tem que conhecer bem.
Segundo: o processo exige uma preparação de terreno para que a startup não se perca no labirinto decisório da empresa. Sem um bom entendimento e apoio das pessoas da empresa, a startup baterá com a cara em políticas corporativas, aversão ao risco, resistências passivas e disputas internas que tornarão o processo lento, doloroso e, às vezes, fatal. As condições negociais (prazo, exigências, contratos, regras, etc.) precisam ser adaptadas e flexibilizadas para o fato de a startup não ser um fornecedor comum, mas sim um parceiro na busca de inovação.
Terceiro: é importante fazer ajustes e atingir bons resultados pontuais, mas o objetivo final é encontrar a escalabilidade. Isto porque a startup só tem sucesso com a escalabilidade e a empresa só terá ganhos se a inovação trouxer um impacto relevante. Encontrado o “fit”, escalar a solução exigirá um bom roteiro de trabalho futuro e um projeto financeiro. Este momento é um ponto importante de decisão para ambas organizações. Na maioria dos casos a decisão de escalar envolverá aspectos estratégicos. Além da confiança mútua, é importante ter algumas regras claras definidas conjuntamente, que evitem que a startup seja vítima do sucesso que ela ajudou a criar.
Quarto: a comunicação entre a startup e a liderança da empresa é absolutamente necessária e tem que ser mantida durante este o longo processo. Fazer inovações com startups mexe com os hábitos e com a estratégia da empresa. Não é algo fácil ou de sucesso rápido. Exige persistência e a vontade de aprender novos caminhos. Além disto as pessoas dentro da empresa têm que lidar em paralelo com as metas relacionadas aos negócios existentes, que pagam as contas, e lidar com questões de compliance, legais, de auditoria, entre outras. O entendimento, tolerância, apoio e os “atos de fé” da liderança da empresa são fundamentais para seguir adiante, eliminar barreiras e modificar políticas. Isto exigirá um acompanhamento continuo porque o tempo é crítico para as startups que precisarão de reações e ajustes rápidos.
Quinto: é necessária uma relação que aceite perdas e erros inerentes à busca de inovações disruptivas, sem que se apontem “culpados” e uma atitude de transformar aprendizado em oportunidades. Isto pede novas ferramentas para avaliar, celebrar e recompensar as pessoas que ousarem estar diretamente envolvidas com este ambiente de altíssimo risco e de incertezas.
Sexto: A responsabilidade do sucesso é de ambos os grupos, mas enfatizo que a empresa tradicional terá que colocar um esforço extra para quebrar seus paradigmas corporativos, se reeducar e readaptar, pois para ela o processo de mudança é o mais difícil. Os seus líderes tem o domínio dos recursos e o poder da caneta. São eles que podem mudar as regras, remover barreiras e tratar as startups não como fornecedores, mas como parte de um projeto para permitir inovações disruptivas na empresa.
Estes pontos indicam que a coisa é bem mais complicada e trabalhosa que um observador casual imaginaria quando pensa na idéia de aproximar empresas e startups para empreenderem. Por outro lado, não buscar este encaixe é péssimo para os dois lados e talvez implique em riscos ainda maiores para ambas.
As ações que fazem funcionar a relação startup-empresas são, na realidade, um novo desafio de administração. Não é um trabalho burocrático ou algo que possa ser tratado como rotina. É uma empreitada que tem suas melhores práticas e tem métodos que precisam ser bem entendidos. Exige persistência de propósito, determinação, coragem e talento. A recompensa, além dos fantásticos ganhos pessoais e profissionais, são os legados deixados de novas, belas e lucrativas realidades. Vá em frente!